Tuesday, August 28, 2012








E heis que chega a altura de concretizar uma ideia, de fazer, de começar, de ir.
Vou. Vou tão sem medo pela imensa agonia de todo o medo que tenho. Vou sabendo que do que respiro agora não sobra nada com força para construir o que quero, preciso de ser depois. Vou porque não há outro modo de ficar ou pertencer. Vou embora comigo e sem mim, para onde o clarão ainda se avista para lá de tudo o que entretanto se colocou no caminho. Vou, dilatando o cansaço num copo cheio de tanto que já não cabia em mãos cheias de coisa nenhuma. Vou porque o corpo, conservador, dava já sinais de desistência. Vou de mãos dadas e no conforto do aperto securizante quando as pernas ameaçam fraquejar. Vou porque me doem os pés do caminho e do caminho se faz a vida inteira, onde descubro constantemente o intento. Vou porque quero caminhar. Vou de peito aberto e na coexistência da raiva e do amor. Vou porque o ódio paralisa e só a esperança revoluciona. Vou pela contenda, pela luta. Vou porque só indo posso fazer o combate. Vou porque, lado a lado, sei que tenho comigo o arrepio de coragem que faltava. Vou porque, entre a razão e a emoção encontrou copa o seu melhor equilíbrio. Vou. Vou porque não posso ficar. Vou antes que o tempo faça de mim tempo. Vou.

Thursday, January 12, 2012

As palavras deslizam pelo pavimento dos afectos e confesso custar-me um pouco dar-lhes a corda necessária na escalada rígida da gramática. É mais fácil, quando percorro com os dedos, o silêncio do teu corpo e, assim mesmo, sem dizer nada, dizer tudo; é mais fácil quando nos trocamos, braços e lábios, pernas e risos, sons e ideias, calor; é mais fácil quando, de soslaio, sei que olhas para mim - e tanto é aquilo que vejo nesses olhos, sobretudo quando eles se trocam com os meus - ternura, vontade e um silêncio gritante, ora explosão, ora quietação; é mais fácil quando no abraço, descansas o teu sono e sonhos, quando o sossego da respiração me aquece as costas ou o peito; é mais fácil quando, longe do mundo, não há conceitos nem definições, pré ou pós, quando somos só nós. E dessa lufada de ar fresco, que arde ligeiramente, como os rebuçados de mentol, sobram-me os instantes em que de tão cheio, o peito rejeita o ar, satisfeito.

Portanto não, não é fácil falar de ti, ou do que sinto, ou de que coisa é esta, que me invade os pensamentos, como se tivesse vida própria, sobretudo agora, que estás à distância de um braço e de muito menos que um cigarro, agora, que a vontade se esvai no simples movimento de levantar a manta e deixar-te entrar no casulo que se forma quando as peles se tocam, se partilham.

De um modo singular, contigo, sinto poder caber numa música sem fim, dos álbuns de Late Night Tales, ou num filme da Agnés Varda, que tanto gostas, num plano das tuas curtas, talvez até num quadro gigante de Dali, ou da Vieira da Silva. Assim, dos pequenos gestos, instantes, segundos, reagrupas os momentos numa qualquer arte nova que não sei ainda qualificar, definir, dimensionar sem correr o risco de descaracterizar a tua deslumbrante e meiga simplicidade – não porque o sejas, de facto, mas porque nos teus braços, tudo é isso mesmo, simples, bom, speechless.

Fico-me pelo silêncio, então, para não correr o risco de, ao tentar falar disto que falo, não dizer coisa nenhuma.

[Cliché quanto baste, banal, o menos possível].