Como se guardam os momentos?
Certo dia disseram-me que os melhores instantes da vida, não se emolduram, guardam-se em todo o corpo, na pele, no olhar, nos sorrisos, no coração...
Disseram-me que essas coisas, que se guardam e se amam com a nossa elasticidade corporal, podem também transborda-la depois ou ao mesmo tempo. Da pele das mãos, no toque, passa para as mãos dos outros e das mãos desses outros, ou das nossas, passa para as coisas que gostamos e para tudo que fazemos.
Do olhar, quando olhamos o mundo, e dos sorrisos, quando sorrimos dele e para ele, abraçamo-nos e aconchegamo-nos nessa entrega, expandimo-nos e ficamos maiores…
Finalmente, do coração [com o coração], somos frágeis e captamos a fragilidade e doçura das coisas, sentimos e tocamos o que a pele não alcança e os olhares e sorrisos só reflectem. Com essa bombinha, que trazemos ao peito, amamos e gostamos do que nos rodeia, partilhamos e recebemos afectos, crescemos e tornamo-nos mais fortes.
Nessas trocas, portanto, reflectem-se as marcas dos momentos que nos constituem e ficaram guardados no corpo, lembrados no corpo, mas que se estendem para além dele, sempre, nos lugares, nas pessoas e nas histórias que vamos contando, encontrando e vivenciando ao longo do tempo.
Se a vida é um ciclo então, como aprendemos na escola, só a concebo cíclica desta forma. E se os momentos se podem guardar, de alguma maneira, só se for deste modo, pela troca e pelo pedacinho de nós que fica em todas as coisas, em todos os espaços, e em todo o tempo, pela vida fora.
Assim o é, com tanta força, que ao pensar nisto, em conclusão, pelo meu braço sinto o abraço dos que o partilharam e o sentimento com que o fizeram. Ao fechar os olhos consigo até sentir–lhes o cheiro e lembrar-me da cor desses momentos, as vezes vermelho, outras vezes azul, outras vezes até, o arco-iris. E sei que o que sou e o que são, já não é tão-somente só o que sou e o que são, mas sim já uma extensão do que somos, do que fomos e de tudo o que podemos vir a ser.
O mundo inteiro é um momento e é nesse instante que estamos todos ligados.
.O sentido e a qualidade não faz falta. Hoje não.
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